Olá, meus queridos e queridas. Mês de novembro chegando e como cada ano eu tenho feito, às vezes por vídeo ou outras vezes por outros tipos de postagem, eu venho trabalhar com vocês durante quatro semanas algumas questões relacionadas à negritude e também à fé. E hoje eu parto de algo interessante, que no mês de agosto eu participei do Congresso da Sociedade Brasileira de Teologia Moral, e numa mesa redonda me foi perguntado se eu acredito na possibilidade de uma teologia negra na Igreja Católica.
Em primeiro lugar, eu gostaria de dizer para vocês que essa expressão “teologia negra”, que foi cunhada por James Cone, inclusive, como Black Theology of Liberation, a teologia negra, da libertação. Ela foi cunhada nos Estados Unidos. James Cohen é um dos grandes expoentes dessa teologia.
Aqui eu até trago o livro dele. Teologia Negra, Black Theology. E, hoje em dia, no ambiente da igreja católica, eu vejo isso com uma certa reticência e com um pouco de dificuldade.
A primeira é que faltam interlocutores, ou seja, pessoas que estejam dispostas a assumir, a fazer, a construir, a elaborar teologias que, de fato, venham tratar da questão das negritudes. Teologias que são verdadeiras a partir da experiência, da vivência das pessoas negras. Durante muito tempo, a nossa teologia foi um tanto embranquecida, ou ela nasceu branca.
De certo modo, não nos compreendemos nela e nem a partir dela. Cohen vai dizer algo muito interessante. A teologia negra busca criar uma norma teológica em harmonia com a condição das pessoas negras e uma revelação bíblica.
Por um lado, a norma não deve ser particular de quem está fazendo a teologia, mas deve ter a sua origem na própria comunidade negra. Isso significa que não pode existir norma para a comunidade negra que não leve a sério sua realidade no mundo e as implicações disso em uma sociedade branca e racista. Às vezes parece que nos ambientes de fé, inclusive no próprio ambiente eclesial, nós negros estamos à margem.
Nós fomos, além de colonizados, traficados, escravizados e, muitas vezes, não nos sentimos contemplados pela palavra de Deus, porque o discurso é, de certo modo, embranquecido. Advém da questão da compreensão de um Deus branco, como se nós não pertencêssemos a este corpo humano que Deus cria. É como se a gente tivesse pegado carona e sobrou ali a rebarba, um pouquinho, para nós.
E eles dizem, então, vocês podem usufruir desse espaço de salvação a partir do seu sofrimento, a partir da sua dor. E é isso que nós temos para vocês. Então fazer teologia negra, hoje, é um sentido mais amplo, seria que as nossas comunidades negras tivessem em primeiro lugar acesso à academia.
A gente dá uma olhada nos mestrados, nos doutorados em teologia, e nós vemos que o número de pessoas negras é muito pequeno, e que, de certo modo, quando fazem teologia ou quando se dispõem a fazer teologia, fazem em outras áreas e não tem esse espaço de interlocução com as próprias questões da comunidade negra, com os sofrimentos da comunidade negra. E isso, para nós, se torna um espaço onde nós não temos fala, onde nós não temos uma produção acadêmica expoente, grande, no ambiente católico.
A gente vê que os protestantes estão à nossa frente há muito, muito mais tempo. Então, um exercício que nós pensamos fazer hoje, a partir da Igreja daquelas pessoas que gostam de teologia, que se identificam com a teologia, procurar as academias, procurar as universidades e se embrenhar nesse caminho de reflexão. Por quê? Estamos perdendo várias áreas do saber, várias ciências já estão ocupadas com a questão das negritudes, e nós vemos que cada vez mais aparecem expoentes, seja na sociologia, na psicologia social, nós temos exemplo da Cida Bento, por exemplo, que trata a questão do pacto narcísico da branquitude.
Outros nomes que vão surgindo em outras áreas, na filosofia etc. Mas a teologia na Igreja Católica ainda está muito aquém. Aquém de trazer à tona reflexões pertinentes que tocam na questão das pessoas negras e que tem, de fato, incidência na vida prática dessas pessoas.
Então, precisamos fazer uma autocrítica da teologia e começar a pensar em produções que sejam antirracistas. Por isso, hoje eu digo com muita tranquilidade que a teologia precisa passar por um letramento racial. Visto que conhecemos vários recortes teológicos, várias interfaces da teologia, mas, no que diz respeito à questão das negritudes, ainda estamos muito, muito silenciosos.
E por faltar, principalmente, pessoas que se dedicam a esse fazer científico, criar um caminho epistemológico no qual a teologia também tenha a tonalidade de pele negra, onde ela tenha traços negros no seu rosto, na sua fala, no seu incidir na vida das comunidades.